15 de out. de 2009

A camisola de R$ 60,00

Acho que eu tinha 24 anos. E lembro que naquela tarde, eu e minha avó tínhamos ido num bingo de cartelas e ganhamos R$150,00. Apesar de ela ter pago a diversão, o trato sempre era que dividiríamos o prêmio. Ela sempre ganhava e eu abocanhava minha parte sem grandes esforços porque a vovó tinha sorte.
Então lá fui eu com os R$ 75,00 que me cabiam para o shopping. Eu estava tão absurdamente feliz que tinha decidido impressionar, arrasar, arrombar, acabar com tudo que tivesse solidez e fazer da sua estrutura um pinto mole digno de virar piada. Eu lembro de sentir meu coração disparando, meus poros abrindo e erguendo meus pelinhos do braço e eu estava mesmo era me achando uma mulher incrível porque ia torrar minha pequena fortuna em algo para te impressionar muito ao invés de deixar em uma balada e meia me divertindo com estranhos que dançam mal e parecem todos uns bandos de metrossexuais esquisitos. Entrei na loja assim com o peito estufado afinal, eu queria arrebentar mesmo. Coluna ereta, bolsa na paralela do braço, depilei a perna antes de ir. Tudo direitinho. A vendedora se aproximou e me levou na arara certa. A arara linda de camisolas mais lindas ainda e deliciosamente sugestivas. Olhei todas, uma a uma para ver qual combinaria mais com o momento que viria de noite. Minha mente de adolescente grande, retardada e colecionadora de histórias idiotas imaginou todas as declarações do mundo e todas aquelas promessas que sempre parecia que você ia fazer mas que você nunca teve cu para fazer e por isso, sempre fingia que faltava o ar nos momentos em que sabia que eu estava esperando você dizer todas aquelas merdas verdes soavam valsa nos meus tímpanos estourados. Ou eu que nunca tive cu para admitir que as declarações eram grandes e incríveis invenções da minha cachola iludida pela temperatura das nossas ventas e desse seu termômetro amarelo antigo e cheio de bolor.
Eu tinha R$ 75,00 e por isso eliminei de cara as que custavam mais que R$60,00 porque tinha que pagar o estacionamento do shopping que, quando eu tinha 24 anos já era caro. Isso não era problema porque as de R$60,00 eram charmosas também. Só não tinham as mesma rendas e nem nada assim tão babado e tão elegante quanto as que custavam R$90,00 ou mais. Quanto mais babado e menos tecido mais cara. E lá fui eu, a furtadora de prêmios de bingo de vovózinhas inocentes, ao provador. Lá dentro com oito cabides, um espelho e minha falta de vergonha absoluta comecei: cada camisola uma pose de perfil nova, bem sensual. Tudo para impressionar. E a frustração entrou pela fechadura do provador quando eu lembrei que nada aquilo era o que eu era. E afinal você tinha que gostar de mim exatamente como eu era. Cazzo.

Vesti num golpe só a roupa e sai em direção à arara oposta das camisolas lindas e deliciosamente sugestivas. Eu tinha acabado de decidir: ia levar a que estava na vitrine. De algodão, verde água e que brilhava no escuro os dizeres em amarelo fluorescente: I wanna say how much I love you. Por apenas R$ 28,90.

2 Comentários:

caroline disse...

Delícia de texto para ler! Adorei!
beijos
carol

15 de outubro de 2009 às 12:37
Sonia disse...

Adoooooooooro!
Sonia

16 de outubro de 2009 às 13:19